CANSAÇO…

Lamento informar que esse texto, publicado pela primeira vez em 6 de janeiro de 2009, continua atual. Nada mudou para melhor.

Tá difícil engatar a segunda e ganhar alguma velocidade nesta volta ao trabalho. Pra todo lado que a gente olhe é tanta mesmice, tanta mediocridade, tanta falta de respeito pelas coisas mais simples, que o desânimo sobe em ondas, como uma enchente de água suja, irrefreável, inescapável, engolindo a mobília que durante tantos anos fomos acumulando na alma, encharcando de lodo fétido toda aquela roupinha cuidadosamente dobrada que estava nas gavetas do camiseiro sentimental, que é o coração.

Olho para minhas mãos e vejo ali, como numa miragem de filme B, as cicatrizes dos tantos murros em ponta de faca. Do que adianta tanto desgaste? A que leva tanto berro ecoando no vazio? Pra que tentar falar com surdos que não entendem nossos gestos e viram a cara, cegos diante das letrinhas que insistimos todos os dias em colocar diante de suas bocas mudas?

Pra que desperdiçar as últimas reservas de fosfato com ironias, sátiras, tiradas de humor (do bom, do mau e do horrível), se cada vez menos há cultura e ilustração nas cabeças coroadas? Eles simplesmente não entendem a língua que falamos. Não alcançam a mordacidade da crítica, não compreendem o que queremos dizer. E não fazem questão de saber, porque lhes falta, como à cucaracha da música folclórica, las dos patitas de atrás. Ou marijuana a que fumar. Vocês escolhem.

Hoje mesmo estive aqui, sentado à frente deste teclado, com a luminosidade da tela gritando na minha retina, várias vezes. Começava a falar nisso, ia um pouco adiante, desistia. Pérolas aos porcos. Depois tentava comentar aquilo, escrevia um parágrafo, deixava as mãos caírem como folhas mortas e parava. Não adianta, os que entendem não precisam que lhes diga, os que precisam, não entendem. E, finalmente, preocupado porque lá adiante, em alguma ponta desta sinistra rede abstrata e real poderia ter alguma leitora, algum leitor, esperando coisas novas, recomeçava.

Mas não tem jeito. O céu azul esplendoroso, o sol brilhante e o vento gentil, que deveriam encher-me de ânimo, alegria e força, têm efeito contrário. E desisto. Desligo a máquina sem conseguir escrever nada do que gostaria.

Talvez amanhã.


Foto de Constance Kowalik no Pixabay

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Cesar Valente Escrito por:

Jornalista e designer gráfico catarinense, manezinho, setentão. Ex uma porção de coisas, mas sempre inventando moda: a mais nova é o mestrado em Jornalismo na UFSC.